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quarta-feira, 23 de março de 2011

Não é ficção

Rogério Tuma 12 de março de 2011 às 11:05h As inovações da neurociência que vemos em filmes como Avatar já são pequenas diante dos avanços reais da ciência Ao assistir ao filme Avatar, percebi que o público leigo já entende bastante de neurologia, a conexão entre o bulbo que fica na base do crânio com um axônio externo gigante de um pterodonte moderno, o uso de exoesqueletos para aumentar a força e proteção em ambientes hostis, e o principal personagem, um avatar em carne e osso, ou sei lá o quê, não só sob seu controle mas com sua alma incorporada, são todas linhas de pesquisa neurológicas já existentes para que pacientes com alguma deficiência física possam tê-lo corrigido. Além dos aparatos físicos, existem, porém, outras dezenas de linhas de pesquisa. Há grupos de estudos, seguidores de uma orientação de pensamento científico, que utilizam recursos já existentes na natureza humana para reforçar processos naturais e, com isso, corrigir deficiências. Nos últimos dias, diversas pesquisas foram publicadas, demonstrando que um boom em soluções para problemas neurológicos pode estar próximo. Tudo isso se torna possível na medida em que evoluem a ressonância magnética funcional, a tomografia por pósitron, os estudos sobre o metabolismo cerebral e a capacidade de processamento dos computadores, que hoje permitem a criação de imagens tridimensionais dos neurônios e suas conexões. Um estudo da Universidade da Pensilvânia (EUA), publicado na revista Neuron, explica como proteínas que são produzidas no núcleo de um neurônio conseguem ser transportadas para uma terminação nervosa específica, escolhida entre as milhares que o neurônio possui. O doutor James Eberwine explica que existem fábricas de etiquetas dentro da célula. Essas etiquetas são sequências de aminoácidos que ficam grudados na proteína para identificá-la, o que faz com que a proteína chegue ao seu destino. No caminho, ela perde parte desses aminoácidos. É como se, em cada estação, o sistema de checagem retirasse alguns aminoácidos e enviasse a proteína para o próximo destino. Ao chegar lá, a proteína já perdeu a etiqueta, por isso estudos anteriores que avaliavam apenas as terminações nervosas não conseguiam encontrá-las. Outra pesquisa deverá revelar em breve o conectoma do cérebro de um rato. O termo faz referência ao genoma, que é o mapa genético. O conectoma seria um mapa tridimensional de conexões do cérebro. Até agora, a revista Nature publicou apenas um pedacinho do córtex visual do rato. Mas Clay Reid, da Harvard Medical School- de Boston, e pesquisadores associados uniram duas técnicas para construir um mapa das conexões da massa cinzenta do cérebro do rato responsável pela visão. Primeiro, eles injetaram substâncias que medem a atividade metabólica das células da visão em um rato vivo. Depois, mataram o rato e cortaram a parte de seu cérebro responsável pela visão, cujo volume corresponde a oito milésimos de um milímetro cúbico, em 1.215 fatias. Fotografaram então cada fatia em um microscópico eletrônico que enxerga quase até o nível das moléculas. Ao juntar os 3 milhões de imagens conseguidas, os pesquisadores reconstruíram- a imagem em 3D em um computador. Aquele mínimo pedacinho de cérebro, no momento em que foi ativado por um feixe de luz, gerou 40 terabytes de informação e permitiu que dez neurônios fossem avaliados, criando uma nova área da neurociência: a “conectonomia funcional”. Outro estudo, também publicado na edição de 10 de março da revista Neuron, mostrou que o liquor, o líquido que banha o cérebro e a medula, é muito mais que um simples sistema de absorção de impacto para evitar que o cérebro se choque contra o crânio. É composto de diversas proteínas e, entre elas, existem substâncias que estimulam e orientam a divisão de neurônios. Um estudante, Zappaterra, e dois cientistas, Walsh e Maria Lehtinen, comparam o liquor de embriões humanos com o liquor de adultos. Descobriram que quanto mais jovem o ser humano maior é a concentração de uma proteína chamada fator de crescimento tipo insulina, o Igf2. Esta proteína, quando colocada em cultura de neurônios, provoca intensa divisão celular com criação de novas células. Os pesquisadores descobriram também que pacientes com glioblastoma multiforme, o tipo mais agressivo de tumor cerebral, possuem altos níveis desta proteína no liquor. Se estiverem certos os autores, o estudo traz grandes avanços. O Igf2 pode ser utilizada na regeneração do sistema nervoso em pacientes com lesão medular, acidente vascular ou esclerose múltipla. E, se conseguirmos bloquear o Igf2 em pacientes com tumores cerebrais, inibiremos o seu crescimento. Podemos enxergar com esses poucos exemplos um holofote no fim do túnel, estamos nos aproximando rapidamente de um final, ou melhor, de um reinício feliz de vida para os milhões de pacientes que sofrem com alguma sequela neurológica. • http://www.cartacapital.com.br/saude/nao-e-ficcao

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